Os norte-americanos estão realmente pirando em futebol?
Uma análise do Mundial de Clubes e o impacto da crescente cultura do futebol nos EUA nos últimos anos

Em junho de 2025 começou o Campeonato Mundial de Clubes da FIFA, com um formato totalmente diferente do que estávamos acostumados. Não vou entrar aqui em pormenores do que é de fato esse campeonato e como é realizado, mas quero falar de ONDE ele acontece esse ano: nos Estados Unidos.
A justificativa desse campeonato de clubes acontecer nos EUA é de que a Copa do Mundo de 2026, a próxima, vai acontecer por lá também. Então já fica meio que tudo em casa, testa os estádios, as arquibancadas e tudo mais.
Nos últimos anos, nos Estados Unidos, tem se notado uma crescente percepção do futebol enquanto não só esporte, mas como uma atividade muito bem remunerada e visada. Com a chegada de ídolos como Messi, Busquets e afins nos times da Major League Soccer (a liga americana), esse interesse passou a ser ainda maior, não só dos torcedores, mas das pessoas que investem no futebol do País.
O que antes era um esporte ligado à escola, às crianças e até mesmo zoado pelos adultos americanos, que julgam basquete e futebol americano superior ao “soccer”, hoje tem se visto uma possibilidade imensa de fazer dinheiro com isso e de se ter um lazer coletivo agradável chutando bolas de futebol.
Existe com isso, uma crescente cultura do esporte nos Estados Unidos, pegando um pouco de cada referência de outros países: a moda Bloke e de camisetas vintages da Europa; a onda de juntar sua gangue e jogar numa quadrinha dos países Sulamericanos; a de empresários (por que não?) de ver num esporte gigante uma oportunidade de lucrar mais e por aí vai. Mas isso faz barulho em meio a outros esportes mais queridos por lá?
Ascensão de clubes amadores ligados à cultura e estilo
Em cidades grandes como Nova Iorque, é fácil encontrar crews que montam seus times, criam seus uniformes e fazem coletivos muito legais de futebol ligados à cultura do jogo. Crews como Chinatown Soccer Club, Gatos FC e First Touch FC, bebem da fonte de designers, skatistas, fashonistas e outros ativos gigantes da cultura de rua para trazerem na sua estética toda uma parada cultural do futebol além do jogo.
Os caras se preocupam com o estilo, com seus kits, com o jeito que vão mostrar seu jogo pro mundo… Um jeito bem americano, se parar pra pensar, porque talvez a performance fique até em segundo plano, uma vez que o foco são nessas outras coisas. Se preocupam mais em “vender a ideia” do que, talvez, de fato, jogar pra ganhar.


Os caras jogam bola até na neve, bicho. Comprometimento. (foto: CSCNY Instagram)
No fim, acabam lucrando, fazendo produtos e atraindo pessoas para esse esporte, tendo até lista de espera para que novos membros possam bater uma bolinha no parque local.
Enquanto isso, cresce o número de marcas e lojas de camisas vintage nas cidades. Marcas como Soho Warriors e Scenes NY já extrapolaram a parada de ser só o uniforme da galera local e vendem até em lojas de streetwear, enquanto lojas como Village Soccer Shop e Nikys Sport vendem o lifestyle em camisas, chuteiras, cards, pôsteres e muito mais.

Esse artigo da SoccerBible trata sobre a alta da cultura do futebol fora da quadra e, ligando sua tecla sap ou traduzindo no seu browser, é bem legal para continuar essa conversa.
Mais marcas fazendo chuteiras e bolas pensando no mercado americano
Mais cedo esse ano a gente entrevistou a Eleven Football, uma marca de chuteiras dos EUA que estava fazendo chuteiras do zero. Essa é só mais uma que está firme em solo americano tentando fazer acontecer na cultura do “soccer”.
A espanhola Kelme é uma que está apostando fime no futebol norte-americano e tem trazido várias operações da marca para os EUA. Nesse perfil, @kelmecalifornia, os caras focam majoritariamente em futebol para suas ações no país.
A adidas, por sua vez, é a principal atuante no segmento nos Estados Unidos, mais até que a local Nike. A marca das três listras é a principal ativadora do esporte no País, patrocinando a Major League Soccer de forma exclusiva, garantindo que todos os times TENHAM QUE SER patrocinados por ela mesma. É exatamente isso que você leu, não tem time da MLS com outra marca fazendo o material esportivo.

Existe um interesse enorme da adidas nesses grandes eventos esportivos ligados ao futebol e eles fazem cada vez mais força para que estejam conectados com os Estados Unidos, palco desses próximos grandes acontecimentos futebolísticos.
Alta da cultura futebol no fashion das grandes cidades
Nas grandes cidades norte-americanas, o fashion anda lado a lado com a cultura jovem, sendo impactados por trends de todos os tipos. Uma delas, que a gente até já falou aqui em ISMO, a da alta da cultura do futebol, também é bem notável por lá.
Não é difícil achar o combo “tênis que parece chuteira + camisa de time” em homens e mulheres por lá. Se é uma tendência mundial, os Estados Unidos, gostando ou não de futebol, não iam ficar de fora. Então sim, talvez essa percepção fashionista também seja mais uma que tenha trazido bastante atenção pro futebol nos EUA, modificando até uniformes da Major League Soccer e deixando-os mais apelativos e bonitos.

Mas será que usar uma camisa do Barcelona de 1998 e um par de adidas Samba realmente leva alguém à consumir o futebol como cultura? Isso nos leva à nosso próximo tópico:
O norte-americano está realmente se interessando pelo futebol?
Mesmo com o Mundial de Clubes acontecendo, a percepção dos estadunidenses com o futebol é bem diferente, até mesmo no estádio. Torcem para qualquer time que está jogando, fazem coros desengonçados, se pegam em gafes de regras, gritando gol quando está claramente impedido… Uma infinidade de acontecimentos normais para quem está lá pelo espetáculo e não pelo futebol em si.
As torcidas que cantam são aquelas que foram importadas de seus países, pagando passagem para ver seu time na competição. A do Palmeiras, por exemplo, fez uma festa gigantesca na Times Square, lotou a parada mesmo, mas era tudo brasileiro.

Fora dos estádios, as pessoas vivem suas vidas normalmente, indo a bares de esporte que não passam jogo de futebol nenhum. Nesse vídeo do Tomer Savoia e do Cartolouco, que estão cobrindo o Mundial de Clubes in loco, eles mostram que ninguém está ligando muito para o nosso futebol jogado e que esportes como poker, boliche e crickett ganham as TVs do bar que estão, enquanto nenhuma está passando o jogo ao vivo do Mundial.
A torcida estadunidense mais próxima de uma torcida brasileira ou europeia em termos de fanatismo é a do LAFC, que se inspirou na torcida do Borussia Dortmund para criar a sua própria "muralha amarela" e seus dirigentes até fizeram intercâmbios em outros países para criarem ainda mais essa atmosfera de um estádio barulhento e fanático.

Tudo bem que o Mundial de Clubes não é tão interessante quanto uma Copa do Mundo e ano que vem teremos outras percepções. Mas parece que o norte-americano tem uma grande dificuldade para achar graça no futebol de pés. Vale lembrar: já teve uma Copa nos Estados Unidos em 1994 e nem assim o norte-americano virou o povo mais viciado em futebol de todos.
Essa cultura de futebol crescente nos Estados Unidos está presente nas grandes cidades como Nova Iorque e Los Angeles, mas isso é uma parcela muito pequena do que é o potencial do esporte no país. Nos interiores dos caras, é difícil ver gente achando que futebol é trampo e que isso vai virar de alguma forma.
Se a gente parar para analisar até mesmo o que acontece nos grandes centros, o Chinatown Soccer Club, que a gente falou aqui antes nesse artigo, existe desde 2002 e, não necessariamente, fez com que Nova Iorque se tornasse um palco principal do futebol de rua do mundo.
O futebol ainda tem muito a caminhar por lá, isso se realmente existir algum espaço do público pra isso.