O que esperar de skate.?
Depois de 15 anos, a continuação de Skate 3 está em acesso antecipado, mas o hype não parece ser dos melhores
Depois de anos de clamor incessante e uma espera que se estendeu por mais de uma década, os gamers skatistas, ou skatistas gamers finalmente têm algo para celebrar. O acesso antecipado para o tão aguardado skate. está oficialmente aberto. Desde o lançamento de Skate 3, em 2010, a comunidade de jogadores manteve uma dedicação quase maníaca, abarrotando as caixas de comentários de todas as publicações da Electronic Arts no Instagram, independente do assunto, com o mesmo mantra: "Cadê o Skate 4?". O pedido virou meme, quase um símbolo, e que agora, 15 anos depois, finalmente se tornou realidade. Mas a pergunta que fica é: será que a expectativa criada será atingida, ou o resultado é só mais um jogo genérico de uma empresa cada vez mais criticada.
O anúncio oficial foi feito em 2020, durante um evento próprio da EA, e a recepção não poderia ter sido melhor. Para muitos, a notícia era boa demais para ser verdade. O título, apenas skate., sem o “4”, sugeria um retorno às origens, um recomeço com o objetivo de capturar a essência que tornou a trilogia original tão amada: uma física realista, gameplay intuitivo e uma abordagem mais leve e próxima à cultura do skate, que se diferenciava do estilo arcade dos Tony Hawk's Pro Skater da vida. Nos anos seguintes a expectativa foi ganhando corpo, mas o processo de divulgação não acompanhou, e a entrega se resumiu a pequenos vlogs de desenvolvimento e vídeos de bastidores. As inscrições para os testes alpha e beta foram abertas e a comunidade saiu correndo, na fissura por uma chance de testar em primeira mão. A promessa era de que a EA estava ouvindo a comunidade e construindo o jogo ao lado dela, um discurso que, na teoria, é lindo.
O Legado de Skate 3
Para entender o fascínio por um jogo de 15 anos, é importante olhar para o impacto que o primeiro Skate trouxe e que Skate 3 consolidou. Na época, a única grande franquia de jogos de skate era THPS, que reinava absoluta com seu estilo arcade, manobras absurdas e combos em fios elétricos e quinas de prédios. Quando o primeiro Skate foi lançado, em 2007, ele mudou fazendo o óbvio: ao invés de apertar botões para fazer manobras impossíveis, o jogador usaria os analógicos para simular o “pop” e “flick”. Para quem nunca andou de skate, parecia estranho e difícil, mas isso aproximava leigos e praticantes ao redor do que faz o skate ser o que é, a frustração de errar e o prazer de conseguir acertar depois de muito esforço. Skate 3 pegou essa fórmula e melhorou com um mapa maior, mais opções de personalização e elementos da realidade.




Enquanto THPS se concentrava em colocar skatistas profissionais como personagens jogáveis, Skate trouxe para dentro do jogo uma penca de indivíduos do ecossistema do skate. Além de skatistas, claro, o jogo incluiu os fotógrafos Giovanni Reda e Atiba Jefferson, o então editor-chefe da Thrasher Jake Phelps (RIP), e lendas como Jason Lee. O jogo não era só sobre manobrar, mas sobre conhecer a cultura do skate de forma genuína, criando uma comunidade que se estendeu pra além do videogame.
O lançamento de Skate 3 em 2010 também aconteceu em um momento muito particular para a indústria do skate. Era uma época em que as marcas core, ou endêmicas, ou seja, aquelas criadas e gerenciadas por skatistas, ainda tinham força e influência. Foi um período de transição, mas o mercado do skate ainda era muito organizado por skatistas.
Comparado àquele cenário, hoje é outra realidade, já que muitas das marcas foram vendidas ou faliram. Grandes corporações que não tinham nenhuma ligação com o skate agora controlam o mercado de um nicho cobiçado, atraindo marcas de moda que tentam emular uma estética sem entender de verdade. O contexto e as escolhas feitas pela equipe que trabalhou no jogo em 2010 contribuíram para o seu sucesso, e as mudanças para a realidade de hoje podem impactar na forma que o novo game será recebido.
O hype não é a realidade
Com o passar do tempo, as informações foram chegando e nem todas as revelações foram bem recebidas. A primeira cara feia veio com a confirmação de que skate. seria um jogo "free-to-play", ou seja, gratuito. Claro que a princípio isso é positivo, afinal, com um mercado que cobra uma média de R$300,00 por jogo, poder acessar gratuitamente parece incrível, mas para quem conhece minimamente sobre o formato, sabe que a forma de monetização das desenvolvedoras acontece via transações dentro do jogo, o que impacta diretamente na experiência de quem joga. O acesso à mapas, acessórios, manobras, e conteúdos extras provavelmente seriam comercializados.
Por mais que tenham prometido que não seria pay-to-win, sistema que beneficia quem paga, a possibilidade do jogo ser fragmentado e que a experiência completa exigiria um investimento contínuo desagradou boa parte dos fãs de longa data, que se lembravam da fórmula simples e completa da trilogia original. A desconfiança é ainda maior quando se considera o histórico da EA com microtransações em outros títulos, como FIFA.
Outro ponto muito criticado veio quando anunciaram que o game não teria uma versão offline, ou seja, o acesso à internet seria necessário sempre que o game fosse acessado, o que trouxe à memória outro trauma da comunidade. O game de corrida The Crew, da Ubisoft, também funcionava online, e quando a publisher decidiu fechar os servidores, em 2024, o game ficou inacessível para todos e todas que haviam comprado. O caso foi tão sério que gerou um movimento chamado "Stop Killing Games", que promove modelos menos engessados de lançamento.
E para fechar a lista de polêmicas, a capa do jogo, revelada recentemente - e que é a imagem que abre esse artigo - foi outro ponto de atrito. Em uma decisão que gerou mais desconforto do que admiração, a arte foi criada por uma inteligência artificial, gerando uma imagem sem alma e muito distante da identidade visual que marcou a série. A escolha não apenas desrespeitou o trabalho de artistas visuais, mas também ignorou a oportunidade de conectar o jogo a um artista real, talvez uma figura central na cultura que o jogo tenta representar.

Por outro lado, a trilha musical foi um acerto, coisa que a EA nunca teve muita dificuldade em executar. Conhecida pelas trilha de FIFA, agora EA Sports FC, skate conseguiu colocar rap, hardcore, indie rock, dreampop e outros gêneros em uma trilha musical cheia de novos nomes da cena, mostrando que ao menos essa parte da curadoria está bem atenta. A primeira lista de artistas divulgada poderia facilmente ser a do lineup de qualquer grande festival por aí.
O cenário de jogos de skate e o timing
Enquanto a EA se enrolava entre anúncios e polêmicas, o cenário dos jogos de skate se transformou. No gap deixado pela franquia, outros jogos surgiram para preencher a lacuna. Títulos como Skater XL e Session ganharam uma base de fãs dedicada, oferecendo uma experiência ainda mais realista. Enquanto Skater XL se destaca pela física muito próxima do real e pelo sistema de controle que simula o movimento dos pés na hora de mandar uma trick, Session aposta em um controle mais técnico e uma estética de vídeo de skate, com o jogador podendo colocar filtros de câmera VX1000, por exemplo. Ambos os jogos, apesar de não terem o esmero que um grande estúdio pode oferecer, conseguiram capturar a atenção de quem buscava uma experiência em consoles recentes.
Além desses, a Activision mandou bem com os remakes de Tony Hawk's Pro Skater 1+2 e 3+4, abraçando a nostalgia dos anos 90 e 2000. Embora a proposta seja diferente, os remakes mostraram que a fórmula clássica ainda funciona e que o público estava com saudades da franquia.
Essa concorrência coloca skate. em uma posição delicada. O desejo por um novo jogo existia porque, por anos, não tinha nenhuma alternativa. Agora, com Session e Skater XL estabelecidos, a pergunta é: será que o timing para o lançamento de skate. não foi perdido? Os fãs mais hardcore, que antes não tinham opções, já encontraram sua casa nesses novos títulos. O público que busca uma experiência arcade tem os remakes de Tony Hawk. O novo skate., então, não chega para preencher um vazio, mas pra competir em um mercado que ele mesmo ajudou a criar. A aposta da EA é no apelo do nome da franquia e talvez numa possível base de fãs.


O Futuro de skate.
O early access está aí, e a comunidade tem a chance de ver se o jogo realmente corresponde às expectativas de mais de uma década. A física parece similar, e o novo mundo aberto, “San Vansterdam”, promete ser um parque de diversões vasto e cheio de possibilidades para os skatistas virtuais. Mas será que a EA consegue equilibrar a monetização com uma experiência não invasiva pra quem joga? Será que a jogabilidade não ficou datada e o pessoal se acostumou com os jogos mais recentes?
A comunidade tem o poder de influenciar o futuro do jogo com feedbacks durante o acesso antecipado. A EA, do lado de lá, precisa mostrar que está realmente ouvindo, e não apenas seguindo um plano de negócios aprovado por caras de terno. O veredito sobre se a espera de anos valeu a pena ainda não pode ser definido. A discussão continua, e a bola, ou melhor, o carrinho, agora está nos pés virtuais dos jogadores. Será que o novo skate. será o renascimento ou apenas a sombra do que a franquia foi um dia? Só jogando pra saber.