Chora, AI: David Carson assina campanha global da Converse
A imperfeição humana segue sendo a faísca que diferencia

Em uma era onde algoritmos dominam, AI se prolifera e o design gráfico parece preso em seguir fórmulas prontas e modismos, a nova campanha global da Converse para a linha Heritage é um tapa na cara da previsibilidade visual - uma explosão de matéria, memória e gesto humano. E quem dá esse tapa, como não poderia deixar de ser, é David Carson — o designer gráfico que, desde o início dos anos 90, já desconstruía tudo antes mesmo da internet virar o mundo de cabeça pra baixo.

Criada em parceria com o estúdio novaiorquino WØRKS, Carson injetou alma, ruído e caos criativo numa estética dominada por linhas retas, fontes legíveis e imagens perfeitas. Em vez disso, temos colagens rasgadas à mão, letras fora de lugar, sobreposição de elementos e texturas que mais sugerem do que explicam.
Pra quem conhece sua obra e legado, o resultado é David Carson puro. Que, mais do que nunca, é profundamente necessário agora.
A beleza na imperfeição
O impacto de Carson no design gráfico é quase indescritível. Ele transformou erros em linguagem. Desrespeitou grid como quem escreve poesia. Fez da legibilidade uma escolha, não uma regra. E com isso, virou referência.









Carson e seu trabalho na Raygun, quebrando todas as regras do design
Seu trabalho na revista Ray Gun, nos anos 90, desconstruiu a lógica editorial, e sua abordagem visceral se tornou símbolo de uma estética que abraça o acidental, o intuitivo e o não planejado. Em tempos onde AI é sinônimo de previsibilidade, revisitar Carson é como redescobrir a rebeldia original do design.
Ele não está interessado em agradar o algoritmo. Está interessado em provocar o olho.
Design em movimento
O modelo de tênis Wave Trainer, um dos destaques da campanha, já carrega no nome e no design o conceito de fluidez e transição — e Carson traduziu isso visualmente com maestria. Nada é estático na campanha. As formas se chocam, os elementos se movem, a tipografia escapa dos padrões. O tênis vira parte de uma narrativa gráfica que reflete não apenas estilo, mas atitude.
O design do tênis se comunica com a direção de arte: experimental, ousado, vivo. É o tipo de produto que não tenta agradar a todos — e, por isso, agrada quem tem olhar próprio.
Manualidade como resistência estética
O mais potente nessa campanha é o gesto. Literalmente: o gesto manual. O traço não vetorial. A colagem feita à mão. A imperfeição como propósito.

Em um tempo em que a AI já escreve roteiros, gera imagens assustadoramente realistas e edita filmes, o trabalho manual virou uma espécie de resistência criativa. Uma maneira de dizer: “isso aqui tem toque, tem suor, tem decisão humana”.
Carson não compete com a AI — ele responde a ela com aquilo que nenhuma máquina pode emular: intuição, imperfeição, emoção.
Quando o processo também é a entrega
Como parte do processo criativo, Carson criou mais de 20 colagens à mão, usando materiais do acervo da Converse: anúncios antigos, estudos técnicos, fotos de produtos, recortes de tênis físicos (como solas e cadarços), além de papéis, canetas, tintas e colas.
Esses elementos foram sobrepostos, rasgados, rearranjados e recompostos com liberdade absoluta — sem grid, sem layout pré-definido, apenas feeling. O processo todo foi documentado, transformando não só as peças finais em arte, mas também o próprio gesto de criação em conteúdo.
Das 20 colagens produzidas, 14 foram escolhidas para fazer parte da campanha global e agora os originais vivem permanentemente na sede da Converse, em Boston.
Em terra de AI quem tem mão é rei
Chora, AI. Porque por mais que você preveja, aprenda e simule, você ainda não entende a beleza da imperfeição.
A campanha da Converse com David Carson não só se destaca — ela rompe.

Rompe com a ideia de que o design precisa ser limpo, legível, organizado. Ela nos lembra que diferenciação vem da coragem de ser estranho, complexo, imperfeito.
Em um mar de campanhas assépticas e feeds monótonos e previsíveis, o ruído diferencia.