8 álbuns/EP's brasileiros de grime
A história do gênero no Brasil em alguns projetos essenciais

O grime esteve no Brasil desde sempre. Quase que contemporaneamente ao seu surgimento lá em Londres, no começo dos anos 2000, rappers brasileiros como MV Bill, Xis, o grupo Z'África Brasil, Jimmy Luv e Russo Passapusso já experimentavam com a sonoridade em território nacional.
Aproximadamente 10 anos depois, os lançamentos de TIPOLAZVEGAZH do Vandal e Elevador do Febem marcam uma segunda onda de trabalhos que exploram a sonoridade do grime. Esses sons já apareciam nas festas, mas sempre causavam muita estranheza e eram pouco abraçados pelo público, por causa das suas batidas violentas e pouco dançantes.
Uma terceira onda aparece no final de 2018, com o surgimento do Brasil Grime Show, projeto dos DJ’s DiniBoy e ANTCONSTANTINO, cujo propósito era disseminar a cultura dos dj sets e da música eletrônica underground, convidando rappers que não estavam acostumados com aquele som para se arriscar em cima dos beats. O público começou a se interessar pelo gênero, que alcançou nos anos seguintes o seu ápice de reconhecimento com trabalhos como BRIME!, 40˚.40 e Atabagrime, que buscaram misturar as sonoridades inglesas com os ritmos do funk e do rap brasileiro.
Vivemos hoje um momento muito importante para a cena, mais conectados que nunca com os ingleses e com coletivos espalhados por todo o país movimentando a cultura, com festas e projetos que carregam a pura essência do grime, como: Leigo Records, destalado., Grime Station, Raridade Records, SUBSOLO, Terra à Vista, NADAHITS, BLACKMESA, Faraoh Grime Tv e Escambo Rádio.
Mais do que um som específico, o grime é uma cultura, um jeito de se fazer as coisas que encontrou grande reconhecimento em terras brasileiras, principalmente pela originalidade e autenticidade da parada.
Essa lista conta com 8 álbuns e EP’s que mostram a variedade do gênero no Brasil, e são necessários para um entendimento da cena:
40˚.40 - SD9 (2020)
40˚.40 é o disco que todo mundo precisa ouvir. Na medida certa, apresenta a fusão entre o funk proibidão e a energia soturna e metálica do grime, buscando mostrar o verdadeiro Rio de Janeiro com todas as suas dualidades e tensões. O encontro entre os gêneros não é à toa — a combinação entre beats energéticos e letras que falam da realidade violenta é característica de ambos. SD9 encontrou no grime uma nova sonoridade que o permitiu ampliar o que já vinha sendo feito no funk há anos, explorando os instrumentais crus e assertivos que abrem espaço para o discurso.
A sonoridade do álbum se define nessa mistura entre os timbres do funk e do grime, mas se amplia para a música eletrônica em geral ao explorar elementos do drill, breakbeat e UK garage. O principal aqui é a energia, e mostrar as diferentes facetas tanto da realidade do artista, como das produções instrumentais. O disco foi produzido por Rennan Guerra e conta com diversos beatmakers, como DiniBoy, Chediak, VHOOR e DIIGO, além de feats com D r o p e, LEALL, VND e N.I.N.A, grandes nomes da cena.
O disco de SD recebeu, em julho de 2020, a pontuação de 7.8 na Pitchfork, portal conhecido por ser bastante criterioso e que poucas vezes olha para o Brasil. Serve para mostrar a importância e impacto que o trabalho tem, não só na cena local. Em 2021, recebeu a versão deluxe, que conta com diversas músicas novas e remixes, solidificando a caminhada e lugar do SD9 na cena nacional.

BR 140 - AKA AFK (2022)
BR 140 se destaca por ser um dos únicos trabalhos brasileiros que foca em faixas completamente de grime. AKA AFK é um dos principais representantes da cena nacional, e se propôs a construir um álbum que pegasse a sonoridade inglesa e misturasse com as referências daqui — ao mesmo tempo que criando algo novo, se mantendo fiel às raízes do gênero.
O disco não apresenta nenhuma grande ruptura com a estética londrina, e é uma grande ponte entre as cenas daqui e de lá. Diversas duplas de MC's foram escaladas pra compor o time de BR 140, que também conta com figuras lendárias da cena inglesa, como Spooky Bizzle, Mayday e Jammz. São mais de 20 colaborações, entre feats e produções, composta por artistas que passam por Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, até chegar em Londres.

TIPOLAZVEGAZH MIXTAPEH - VANDAL (2015)
Enquanto muitos acreditam que o grime e o drill chegaram no Brasil nos últimos anos, e que existe pioneiro de alguma coisa nessa guerra de ego, quem conhece Vandal sabe que tudo isso é balela. Em 2007, o rapper já experimentava com o grime, e em 2015, a mixtape TIPOLAZVEGAZH foi lançada — um dos primeiros projetos que explora amplamente a sonoridade do gênero.
A inspiração de Vandal veio muito fortemente de Boy in Da Corner, de Dizzee Rascal — lançado em 2003, é o álbum que marca o início do movimento em Londres. O disco fez com que Vandal percebesse que ele podia soar diferente, e sua identificação foi muito maior do que com o rap americano. Ele conta que a maneira acelerada e frenética de quando começou a rimar no grime não foi muito aceita pelo público, e que aos poucos foi mudando o seu flow, desacelerando e trazendo mais influências do samba-reggae, buscando mais conexão com os ritmos tradicionais de Salvador.
Vandal não se preocupa em estar dentro de alguma caixa que defina sua sonoridade, mas sim em beber das mais diversas fontes e construir a sua autenticidade. As suas mixtapes foram essenciais para a construção do underground brasileiro, e estavam anos luz à frente do momento em que foram lançadas. Se hoje o trap, o grime e o drill existem no Brasil do jeito que existem, muito disso é devido à arte de Vandal.

Cerol - Meio Feel (2021)
Cerol é um EP instrumental do produtor paranaense Meio Feel. Lançado em 2021, o projeto contém 6 músicas, que exploram com maestria a amplitude da sonoridade do grime. É um dos grandes momentos da cena nacional, em que Meio Feel transborda os limites do gênero, flutuando de momentos mais agressivos e intensos, até músicas mais etéreas e sensíveis.
Muitas vezes, esses riddims se transformam em músicas de algum MC, o que é o caso em metade das faixas aqui. Fifa Street e Radar estão presentes no BR 140 de AKA AFK, sendo o beat de FIFA STREET e Glória Eterna, respectivamente, enquanto Bicuda Riddim aparece em Ameaça Detectada, de Bruno Kroz, servindo de base para Vapor.

Ameaça Detectada - Bruno Kroz (2021)
Lançado em 2021, Ameaça Detectada é outro grande momento do grime no Brasil. Nos pouco mais de 10 minutos do EP, o rapper brinca com as possibilidades, subindo a régua do grime brasileiro e entregando muita qualidade e originalidade. Kroz dá uma nova cara à faixas que resgatam a clássica energia do gênero londrino, e inova em momentos como QUEBRANDO E AMASSANDO, com ANTCONSTANTINO, KBrum e BBzão.
Fashion, de ANTCONSTANTINO e Sabe Quem Tá De Volta?, de KBrum, são outros dois EP's que são marcantes na cena nacional. Ambos os artistas, assim como Kroz, fazem parte da Leigo Records, coletivo responsável por diversos lançamentos que são essenciais para o entendimento da cena do grime no Brasil.

SANTA SUCATA VOL.1 - Sucateiro (2024)
SANTA SUCATA VOL.1 é o primeiro álbum de Sucateiro, 100% instrumental e que traz a ideia da reciclagem sonora por meio de diversas técnicas. O disco conta com 13 faixas que apresentam uma faceta especial do grime, mais leve e focada na remontagem de sons. A energia e dinamicidade das faixas mostram como o gênero pode ser divertido, cheio de possibilidades e experimentações.
As faixas remixadas são das mais variadas, contando com samples de Djavan, Racionais, Kendrick Lamar, System of a Down e de Zelda. Quebrando a barreira de pertencer necessariamente a um gênero, as influências que compõem o álbum vem do grime, drill, r&b, jersey club e do hip-hop num geral. Uma obra de arte para quem gosta de música eletrônica instrumental, que desafia os limites e mostra a importância dos produtores num cenário em que muitas vezes são vistos como secundários.

BRIME! - CESRV (2020)
BRIME! provavelmente foi a porta de entrada para muita gente conhecer o grime. A união entre CESRV, Febem e Fleezus trouxe um respiro para a cena musical, misturando as sonoridades típicas do gênero com influências de todo o país e diversos lugares do mundo.
O disco surgiu com a intenção de apresentar para os gringos uma nova versão do gênero criado por eles, ao mesmo tempo que buscava renovar os ares do trap cansado aqui no Brasil. O objetivo foi bem concluído, e o EP ganhou sua versão deluxe em 2024, num processo de transformação em álbum, com os feats gringos perdendo lugar para artistas brasileiros e a consolidação de um movimento.

Grimestar - Tremsete (2024)
O EP de 3 faixas de Tremsete e Zoe Beats é um ponto alto nas produções de grime. Com muita versatilidade, a MC recifense impressiona com seu jeito único de rimar, carregado de originalidade e potência.
O encontro entre a rapper e o produtor se deu por meio do destalado., programa de grime sets do DJ, que é a principal vitrine das movimentações do gênero em Recife. Tremsete brinca nos instrumentais, dançantes e cheios de energia. Zoe Beats também assina a produção de Arrecife, EP de rotciv_ que também mostra muita força e potencial dessa cena que vem crescendo cada vez mais.
